Software Livre – Por que ainda não estamos nessa?

É bem simples de entender o software livre. Trata-se de qualquer programa de computador que garante aos seus usuários quatro liberdades fundamentais: liberdade de usar o software para qualquer propósito, liberdade de estudar como o software funciona e adaptá-lo às suas necessidades (acesso ao código-fonte é essencial), liberdade de redistribuir cópias para ajudar outras pessoas e liberdade de modificar e melhorar o software e distribuir essas modificações para a comunidade. Traduzindo para uma linguagem leiga, essas liberdades tornam o software livre uma ferramenta poderosa para promover colaboração, transparência, autonomia tecnológica e democratização do conhecimento com custos mais baixos.

Neste modelo todos ganham: inclusive a área de tecnologia da informação. Poderíamos comparar a cooperação para benefício mútuo com o pacto federativo para o desenvolvimento da educação. A Constituição de 1988 determinou que a educação brasileira é responsabilidade da União, Estados e Municípios que deverão exercê-la em regime de colaboração, respeitando a autonomia de cada ente federado.

O software livre possui uma grande vantagem em relação ao software proprietário quando o assunto é segurança. Os softwares proprietários por não disponibilizem o código fonte, e por isso, não podem ser auditados. Não é possível conhecer o que ele faz. Assim, áreas sensíveis do governo estão mais seguras quando acessam os códigos dos softwares instalados e os programam de acordo com as suas necessidades. Você sabia que o Pentágono só utiliza softwares livres?

No Brasil há casos de uso bem-sucedido, como os telecentros de São Paulo criado em 2004, que provam a viabilidade do software livre para viabilizar a alfabetização e a inclusão digital, projeto de Sérgio Amadeu da Silveira, que ajudou a conectar a população carente à rede mundial de computadores com os telecentros em diversos pontos da cidade e utilizados por centenas de milhares de pessoas na periferia.

O Rio Grande do Sul implementou a primeira experiência brasileira de tornar o software livre uma política pública tecnológica na gestão Olívio Dutra [1989-1992]. Consiste na formação de uma coordenação estadual composta de governos municipais, empresas públicas e privadas, universidades, ONGs etc para compor o Projeto Software Livre RS. Foram diversas iniciativas bem sucedidas neste período, por exemplo, o Projeto Rede Escolar Livre RS, que reduziu de R$ 87 milhões para R$ 47 ilhões os custos com a informatização de 3.100 escolas gaúchas, atingindo 1,5 milhão de alunos(as) e 80 mil professores (as).

O discurso da “liberdade de escolha” pode ser manipulado para manter monopólios, especialmente no setor de software. Empresas monopolistas usam o termo “liberdade” para defender sua posição dominante, mas restringem a real liberdade de escolha dos usuários. A real liberdade está na adoção de padrões abertos e na garantia de acesso ao código-fonte, combatendo o monopólio e a concentração da riqueza em pequenos grupos de mercado.

Observa-se que o uso de determinados softwares proprietários, a exemplo do Microsoft 365, ocorre sem a devida observância dos princípios que regem as compras públicas, quando o administrador público escolhe implantar um sistema operacional proprietário sem licitar sua aquisição, como se não houvessem outras alternativas. Fato que tem passado despercebido até por órgãos de controle, configurando-se o monopólio de grandes empresas e exclusão de concorrentes; alto custo para a administração pública; comprometimento da transparência e autonomia.

A boa notícia é que o software livre cresce no cenário mundial. A produção de tecnologia da informação é cada vez mais colaborativa, como o é a produção científica. Apesar de um grande universo de softwares proprietários dominantes, desenvolvedores de software livre compartilham suas descobertas e constroem de forma colaborativa. No mesmo sentido, apesar da crescente produção de artigos abertos, grande parte da produção científica ainda está vinculada a um mercado pautado pelo controle e às revistas científicas e editoras que elitizam o acesso aos resultados das pesquisas.

Será por isso que a tecnologia da informação avança tão rápido? No entanto ainda há muitos desafios a serem superados. O Brasil gasta bilhões de dólares com aquisições de licenças de softwares proprietários quando poderia utilizar soluções livres, promovendo inclusão digital e mais controle sobre a segurança da informação. E no setor privado, o acesso é restrito, somente para quem pode pagar as licenças dos programas oferecidos, quem não paga sofre a exclusão digital.

Como sociedade ainda estamos inconscientes sobre os perigos da concentração de mercado de softwares na mão de poucas empresas, como usuários, naturalizamos o sistema operacional da Microsoft como o oficial, a Google e a Meta acumulando nossos dados e meta dados com finalidades comerciais. Será que conseguiremos regulamentar este mercado e abrir espaço para o software livre entre em alguns setores sensíveis, como administração pública e educação? Vamos aderir a este movimento? Podemos começar fazendo com que mais pessoas tenham acesso a esta informação, o primeiro passo para a transformação digital. Quando despertamos para estas questões o tema começa e ser debate na arena política e social possibilitando a criação de movimentos de resistência ao modelo que nos é imposto hoje.

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