Entre a cruz da tradição e a espada da liberdade: a prática educacional aberta como ato político, pedagógico e de amor

O que significa ser professor? Há quem diga que isso é vocação, que muitos por aí não são professores e escolheram esse ofício por diversos outros motivos que não a pré disposição de ensinar. Outros dizem que adquirir o conhecimento necessário para ensinar o próximo, emerge simplesmente de grande experiência entre o próprio estudo e a vivência em sala de aula.

A partir dessa dualidade, o professor se encontra responsável por complexas ações ligadas ao mero fato de ensinar: como o planejamento, a escolha e modulação de conteúdos, ao reconhecimento do contexto socioeconômico e cultural de seus estudantes, aos campos de possibilidades que a instituição de ensino propõe e que seus estudantes vislumbram de acordo, inclusive, com pré disposições socializadas no seio familiar. No entanto, o senso comum reduz o papel do docente à ponta do iceberg: ensinar, avaliar, aprovar ou reprovar. Desse modo, a relação entre conteúdo, professor e estudante por vezes sofre diferentes leituras e significações que vão de encontro à necessidades que estão distantes do ato de construir conhecimento, desenvolver o educando e prepará-lo para ser um bom ser humano na sociedade em que vivemos.

Teacher at blackboard (1924)
Autoria anônima, disponível em domínio público.

Desse modo a grande pergunta sobre esse ofício está em “como fazer?” e logo entramos na grande área das metodologias e dos estilos de ensino, que estão hoje intimamente ligados com os recursos educacionais disponíveis no campo digital. O conteúdo vem pronto, junto com um roteiro fixo do que deve ser feito, lembra mais ou menos uma esteira industrial, entra aluno e precisa sair aprovação. Essa simplicidade de processos faz perdurar a prática, pois o resultado esperado é palpável, fica discriminado acima ou abaixo da média estipulada. Difícil é mensurar as contribuições desse ser humano para a sociedade fora dos muros escolares.

Do que adianta partirmos em outras direções se não estaremos lá para ver os resultados? A resposta para essa pergunta implica em se ter amor pela educação; um amor que muitas vezes é silenciado por necessidades de manutenção de emprego ou de saúde mental assolada por condições ruins de trabalho. Contudo, prover experiências de aprendizagem que coloquem o estudante como coautor do processo e do produto imprime responsabilidade e significado para além do cotidiano escolar. Esse diálogo entre educando e docente traduz o que chamamos de Práticas Educacionais Abertas (PEA). Logo, antes de ser justificada como um ato de compromisso político e pedagógico, a realização de PEAs precisa ser construída por meio do amor ao próximo em conceder condições de liberdade para produção de conhecimento partilhado entre pares e docente.

OEGlobal Voices The Podcast, por Open Education Global, CC BY 4.0.

A construção desse ambiente em sala de aula é processo de longo prazo, que muitas vezes não traduzirá o êxito absoluto e contemplativo para todos os alunos. Nesse caso, amar a si mesmo consiste em ter consciência disso e sempre buscar romper com os obstáculos e variáveis que não garantiram o tão esperado êxito. Além disso, o professor não precisa se sentir inteiramente responsável por todo o processo quando na verdade a comunicação aberta de suas práticas pode tanto engajar outros colegas bem como retroalimentar concepções e estratégias utilizadas em outros contextos.

Desse modo, a visão metodológica sobre o “como ensinar?” precisa dar lugar à visão de intencionalidade do professor. Por de trás da sala de aula invertida, por exemplo, deve estar a intenção de escutar e partilhar entre professor, conteúdo e estudante, cocriando o conhecimento de maneira relevante para o contexto em questão. Enquanto a sala de aula for permeada por tais intenções, a autonomia em cuidar do comum construirá pedagogicamente sujeitos políticos e éticos para o desafio de ser humano. 

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