As leituras sobre software livre foram além de uma simples atividade em sala de aula. Na verdade, foi um exercício crítico, analítico e reflexivo que me possibilitou compreender a importância desses capítulos como pilares básicos, fundamentais, conceituais e filosóficos para entender as nuances do software livre e proprietário. No primeiro contato com a temática da Educação Aberta, logo nos deslumbramos com as inúmeras possibilidades de transformação e aplicação no campo educativo e pedagógico, o que, por sua vez, amplia também nosso entendimento sobre a história e a atualidade.
Considero que a Educação Aberta, além de revelar os impactos profundos que vem exercendo na educação, também apresenta transformações significativas na cultura e na organização da própria sociedade. Ela representa uma quebra de paradigma, pois, além de promover a liberdade para o uso, adaptação, compartilhamento e redistribuição de informações, surge como uma construção coletiva do conhecimento e, consequentemente, se mostra como uma importante forma de inclusão e equidade no acesso ao saber.
A leitura dos capítulos do livro nos convida a refletir sobre temas que perpassam várias áreas do conhecimento, especialmente ao abordar conceitos como ética e colaboração. Acredito que valores como esses são fundamentais em uma sociedade como a nossa, marcada por tendências competitivas de mercado, individualismo e privatização de bens e serviços — fenômenos discutidos há anos por estudiosos da sociologia, economia, psicologia e filosofia, especialmente no contexto da lógica neoliberal, que evidencia dificuldades no caminho do coletivo.
Ao olhar para o passado, entendemos que a Educação Aberta aparece como uma alternativa inovadora e desafiadora diante desse cenário contemporâneo. Se antes o foco era o controle da informação, hoje é o compartilhamento. Isso pode estimular o engajamento de alunos, professores e instituições, interconectando mundos como nunca antes.
Lembro-me de um tempo não muito distante, quando precisei utilizar um determinado artigo no meu trabalho de conclusão de curso da graduação. Segundo a professora, o artigo continha uma informação primordial para a continuidade dos meus escritos. Na época, ela me orientou a enviar um e-mail solicitando a cópia desse artigo, mas, antes, ela mesma teria que pedir autorização, também por e-mail, a um dos autores, pois o artigo ainda não havia sido publicado, apenas submetido à apreciação de editoras. Esse exemplo é interessante, mas não fala exatamente de abertura, já que o artigo estava em fluxo de publicação. No entanto, esse tipo de limitação não se aplica à Educação Aberta.
Com a velocidade das informações que temos hoje, quase dez anos após minha graduação, penso que aquela burocratização teria sido bem diferente com a Educação Aberta, pois ela estimula uma aprendizagem direta, dinâmica, ativa e até interdisciplinar. Com certeza, haveria outras possibilidades de acesso à informação, não apenas enquanto cidadã crítica e criativa, mas também como futura profissional do campo das Humanas, capaz de refletir e atuar em prol de uma transformação social mais ampla, em direção a uma sociedade mais justa e democrática. Poderia, inclusive, compartilhar meus achados com outras pessoas e, assim, ressignificar minha experiência acadêmica junto a quem tivesse o mesmo objetivo.
A partir de uma construção colaborativa entre os alunos, que criaram o resumo de um livro de forma conjunta na Wikiversidade, percebi o quanto é rico trabalhar em grupo com pessoas de diferentes formações e experiências acadêmicas e profissionais. Compreendi, na prática, que o processo de construção do conhecimento está intrinsecamente ligado aos processos sociais. O conhecimento é resultado dos esforços de muitos que vieram antes de nós, não sendo apenas fruto de uma mente brilhante ou de um produto individual.
O movimento do software livre incentiva os usuários de tecnologias a romperem com o modelo fechado e restrito de acesso à informação, ou seja, com o monopólio imposto pelo software proprietário, que busca hegemonia no mercado tecnológico, colocando o interesse comercial acima do conhecimento. Para isso, limita-se o acesso ao código-fonte, deixando o usuário sem liberdade para modificar ou compartilhar. Desde a década de 1960, o conceito de software livre foi além de uma questão técnica, tornando-se sinônimo de luta social para promover a liberdade de usar, estudar, modificar e redistribuir programas de forma colaborativa, coletiva e dinâmica. Esse processo fomenta a interdisciplinaridade e o avanço da ciência, ao integrar saberes diversos e estimular a construção conjunta do conhecimento tecnológico e social, favorecendo o engajamento de pesquisadores e estudiosos em diferentes projetos.
Quando tinha 15 anos, comecei a ter aulas de MS-DOS. Só podíamos avançar para a próxima etapa quando dominássemos o sistema, o que era uma barreira para mim. Depois, quando estava começando a dominar o Windows, o professor falou sobre atualizações do sistema e a necessidade de pagar pelas licenças — era uma burocracia! Naquela época, era comum ouvir: “Faça graduação em Informática, porque será a profissão do século, vai dar muito dinheiro…”.
Anos depois de formada, tive acesso à Educação Aberta, mesmo sem saber! Fiz vários cursos online gratuitos e de qualidade, como os da Universidade Aberta do Brasil, mas não tinha a dimensão do que isso representava. Só foi possível porque algumas pessoas entenderam a magnitude da Educação Aberta, e isso, de alguma forma, chegou até mim.
O software livre promove uma distribuição mais equitativa dos benefícios tecnológicos. Ao garantir as quatro liberdades essenciais — usar, estudar, modificar e redistribuir o software —, o modelo do software livre rompe com as barreiras impostas pelo software proprietário, que visa restringir o acesso ao código-fonte por interesses comerciais.
Assim, as quatro liberdades não apenas ampliam a autonomia dos usuários, mas também fortalecem a colaboração, a transparência e a inovação aberta. Ao possibilitar que qualquer pessoa possa adaptar e compartilhar o software, o movimento do software livre promove a inclusão digital, o avanço da ciência e a democratização do conhecimento. Dessa forma, toda a sociedade se beneficia, já que o acesso livre às ferramentas tecnológicas impulsiona a participação coletiva, o desenvolvimento social e a autonomia tecnológica.
Por que ainda existe o modelo de software proprietário? Por que continuamos a manter esse modelo restrito? Está mais do que na hora de questionarmos e navegarmos por outros mares, colaborando para a construção de uma sociedade mais equitativa, inclusiva, respeitosa, inovadora e democrática. Me pergunto o que será que ainda mantém nesse modelo. Diante de todos os benefícios e possibilidades de transformação social proporcionados pelo software livre e pela Educação Aberta, fica a provocação, o que ainda nos impede, enquanto sociedade, de adotar plenamente esses modelos e romper com as barreiras do conhecimento restrito?
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